terça-feira, março 24

Máquina por Ricardo Righi


(AS)PIRAÇÕES DEPOIS DE ASSISTIR O ESPETÁCULO “MÁQUINA DE PINBALL”


O(s) fetiche (s) contemporâneo(s) está(ão) impresso(s) no espetáculo. Um ponto de partida da reflexão é estar de fato, no século XXI, “Rock n’ roll! Fascículo I, Rock n’ roll! Fascículo I, fascículo XX, siglo XX, século XXI!”, e não saber onde se está, contra quem se está lutando, o que está fazendo. A assustadora abstração da nova forma de virar pessoa física de firma reconhecível, e suas novas e infinitas possibilidades majestosas.
O fato de ser uma possível “geração do SPC” me traz grande felicidade, numa nova possibilidade de se corromper o sistema, internamente, fazendo a cobra se comer pelo próprio rabo “sendo ao mesmo tempo a fome e a comida”, como deve ser feito. Afinal, não se pode prender multidões porque elas estão momentaneamente inaptas a ganhar dinheiro. Ou se pode? O dinheiro que se ganha é a qual custo? Existe sim um milenar paradigma (que não é próprio do artista, como normalmente se pensa) residente na lacuna entre uma existência condizente com sua própria organicidade, crenças e vontades, e a “prostituição” pelo dinheiro. O que traz um novo paradigma (talvez) é a cada vez maior possibilidade de sim, se viver, e muito bem, de acordo com as próprias aspirações. Afinal, o presente grito surdo da ditadura da individualidade, não é justamente o respeito e consequentemente a aceitação moral do modo de viver de cada pessoa, por mais incongruente que seja?
O âmbito pessoal parece se bastar. E de fato, se basta. Em cena, Fidelis é deliciosa e sutilmente vertiginoso sem ser demasiado histriônico. Ribeiro é um gozador, farsesco com notável competência, encarnando em si o desuso imagético contemporâneo, e D’Agostini, como práxis da mulher atual, se sustenta em resolução própria, vagando entre o limbo da consciência-forte e a inconsicência-vida. No entanto, a contracena existe. É aí que a humanidade se frustrará na perspectiva individualista, é SIMPLESMENTE IMPOSSÍVEL viver só, na mínima medida em que se compara ao outro para saber-se correto, e é um ponto fundamental a ser tocado no teatro atualmente.
E é claro que eu sou jovem, também vertiginosamente vivendo todo esse processo de maneira semelhante e equânime aos meus companheiros. E não estamos sós não! Imaginem o que é não estar atualizado, inclusive nós mesmos daqui a pouquíssimos anos. Mas inclusive, não se pode prever isso. O modo de viver já É outro, e essa é pra mim a mais fundamental pontuação do espetáculo. E este não se pode delimitar para um âmbito geral. O que é a desmedida atualmente? A questão se dá para muito além da exaustiva exploração midiática de imagens chocantes. Para muito além da exaustão dos modelos arcaicos, para muito além da exaustão da ordem apolínea, para muito além da exaustão aristotélica e da impossibilidade de se quebrá-la, para muito além da exaustão dos paradigmas, e talvez chegando a um ponto central: exaustão generalizada! Estamos todos sempre muito cansados, repetindo a ideologia da “correria”. Nessa perspectiva, não seriamos então um bando de seres humanos sorumbáticos e solitários? Sim! E somos? Não! Somos todos muito felizes, fazemos festa todo dia! “Ninguém mais tem o direito a infelicidade!” (Estou citando Tom Zé como louco aqui).
E o grito do rock? Em sua origem não está somente o grito de opressão como do blues e do samba, não é o cântico dos escravos. É o grito do orgânico! E nós atores precisamos deixar Grotowski descansar em paz. Ouso proclamar:
“ORGÂNICO! UM PRODUTO SEM AGROTOWSKI...”
É o grito de vida. E me perdoem meus caros, mas é o mesmo grito do Axé. E o rock vai sim salvar o mundo! “Hoje ainda é dia de rock”. Sempre foi e sempre será, não porque precisamos nos comparar ou nos expressar, porque isso é o que Grotowski queria. Ouso mais uma vez proclamar que Grotowski não está valendo mais nada. Seu legado fica para o treinamento dos atores. O teatro hoje precisa aprender demais da energia de um show de rock.
E pra mim essa é a forma como o espetáculo grita. Não tem que limpar nada. Tem é que gritar mesmo. As imagens gritam, o sexo grita, as adolescentes gritam (demais!), os políticos gritam, o grito não é mais uma questão de volume, é a acepção atual. Ó mamãe alta! O incômodo e a tensão me causadas foram justamente o que não me deixavam envolver e ao mesmo tempo me envolviam passionalmente na vontade de decifrar.
Um super-herói, em multicores. É o que cada um de nós é. Um caleidoscópio de crioulo-flash, pulsantemente banhado de mercúrio cromo, com essa coloração vermelha sobre um tom escuro e sombrio como nossos dias, ressaltando as veias de um modo de viver contemporâneo que vive e sangra. O sangue é o grito. O grito é o rock. O rock é o sangue, e Stevie Wonder é Deus também.


PS: Dia 13 de Julho é o Dia Internacional do Rock!



Ricardo Boi
12 de Julho de 2008, 01:41am

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